Filho do lendário Patriarca Moy Yat, William Moy é herdeiro direto da linhagem do Patriarca Ip Man — um dos mais influentes nomes da história do kung fu. Nascido na China e criado nos Estados Unidos, William representa uma ponte viva entre a tradição oriental e os desafios contemporâneos. Além de mestre da arte marcial, é também escritor, educador e guardião de um legado que busca aplicar os princípios do kung fu para o desenvolvimento humano integral.
No dia 26 de março de 2025, o Polo São Paulo de Kung Fu Ving Tsun (Wing Chun) teve a honra de recebê-lo para uma visita especial. O encontro celebrou não apenas a força do clã Moy Yat, mas também o lançamento antecipado no Brasil do livro Kung Fu for Life, publicado antes mesmo da edição original nos Estados Unidos, graças à dedicação do Eduardo Villela, diretor editorial (discípulo do Mestre Sênior Washington Fonseca). Essa obra contou com a revisão técnica e o prefácio feito pelo Grão Mestre Leo Imamura.
O evento foi um marco por reunir gerações distintas do clã em torno de uma mesma missão: manter vivo o legado do kung fu como caminho de desenvolvimento humano, muito além da técnica. Em entrevista concedida no Polo São Paulo de Kung Fu Ving Tsun (Wing Chun), William Moy compartilhou não apenas os bastidores da criação do livro, mas também reflexões profundas sobre corpo, cultura, tempo e transmissão.
“O livro é um instrumento. Não é apenas para proteção. Ele nos aproxima do legado com uma linguagem mais simples”, explicou William.
Um livro que respira vida
Fruto da colaboração entre William e seu discípulo, o renomado escritor Paul Volponi, a obra não se propõe a ser um manual técnico. Pelo contrário, segue a tradição oral do kung fu, transmitindo conceitos e experiências em forma de narrativa. É possível abri-lo em qualquer capítulo e encontrar ali uma janela para a vida.
“Kung fu é tudo. Se você se dedica para desenvolver uma habilidade, seja como chef, barbeiro ou artesão, isso é kung fu”, comentou William, destacando que o livro traz contribuições de profissionais diversos como forma de mostrar que o kung fu é um modo de viver — e não apenas uma arte marcial.
Quem é Paul Volponi, coautor de Kung Fu for Life
Sua formação literária e seu comprometimento com a transmissão autêntica do kung fu tornaram-no o parceiro ideal para dar vida ao projeto Kung Fu for Life. Mais do que colaborar com a estrutura textual, Paul contribuiu com a arte narrativa do livro — entrelaçando vivências, princípios e uma linguagem acessível para tornar a sabedoria do kung fu compreensível a leitores de qualquer origem.
“Quando o conheci, ele já era escritor. E como sabia que eu gostava de escrever, passou a revisar meus textos. A oportunidade de escrevermos juntos veio na hora certa. É uma obra kung fu: ele trouxe a arte dele, eu trouxe a minha, e juntos construímos essa ponte”, compartilhou William.
A parceria entre mestre e discípulo deu origem a uma obra que honra a tradição, sem deixar de dialogar com o leitor moderno — e cuja beleza também está na relação que a originou.
Um convite à prática viva
Durante a conversa, William reforçou que, embora o livro inspire, o verdadeiro aprendizado só acontece no fazer: “Mesmo com o livro, se você não pratica, não aprende de verdade.” O livro é um convite à prática, à presença, à observação — valores cada vez mais necessários em tempos de aceleração digital e burnout.
Kung Fu e Saúde Mental: um antídoto para os tempos modernos
Um dos momentos mais significativos da entrevista foi a pergunta feita por Alexandre Pereira, ex-vice-presidente da SAP, sobre os efeitos da velocidade tecnológica na formação humana. William respondeu com uma visão que transcende o kung fu como arte marcial, propondo-o como prática terapêutica:
“Espero que, no futuro, as pessoas consigam desacelerar conosco. […] Você não pode ter uma boa relação com velocidade. Relacionamento requer tempo, escuta, presença.”
Essa reflexão ganhou peso especial diante do contexto atual: depressão e ansiedade são hoje os principais transtornos que afetam a saúde mental no mundo, especialmente em ambientes de alta performance. A obra Kung Fu for Life oferece, nesse cenário, uma alternativa concreta: cultivar a arte de fazer bem feito, com tempo, consciência e vínculo.
William destaca que o kung fu, ao ser vivido como prática de vida, permite reorganizar o cotidiano com mais eficiência e presença. Ele cita exemplos simples: “Você tem tarefas? Organize-as com sabedoria, evite múltiplas idas e vindas. Isso é kung fu: consciência no fazer, atenção ao fluxo.”
Mas o impacto vai além da produtividade. O livro nos lembra que o corpo é um centro de inteligência emocional e espiritual — algo muitas vezes negligenciado no Ocidente. Ao praticar kung fu com presença, aprendemos a escutar o corpo, identificar padrões emocionais e regular nossas reações, desenvolvendo o que hoje é chamado de inteligência somática.
“A gente aprende o sistema, mas depois de um tempo é ele quem nos conduz. E aí você percebe que não se trata mais só da sua mão. É algo maior.”
Autocuidado, comunidade e espiritualidade cotidiana
Na obra, não há ênfase na luta ou na violência. Pelo contrário, William e Paul constroem uma narrativa que convida à escuta, ao autocuidado e à generosidade. Um exemplo tocante é o reconhecimento que William faz à mãe — “a essência da generosidade”, como ele descreve — por ter sustentado o caminho do pai e da família.
Essa visão integral do kung fu — como caminho de simplicidade, generosidade, eficiência e presença — resgata valores humanos essenciais para o enfrentamento das doenças emocionais modernas. Ao contrário de técnicas pontuais de relaxamento ou produtividade, o livro oferece uma filosofia aplicável à vida, ao trabalho e aos relacionamentos.
“Você pode usar este livro como referência. Em momentos de conflito, ego, exaustão — há um capítulo que pode ajudar. A ideia é essa: te dar ferramentas para viver melhor, do seu jeito.”
Para além do mogung (local de prática): kung fu nas empresas
A fala final de William aponta um novo campo de aplicação: o mundo corporativo. Com leis brasileiras exigindo programas de prevenção ao burnout, o kung fu — enquanto prática de autocuidado integral — pode ser um poderoso aliado.
“Não é só para lutar. É para viver com mais alegria. E ninguém consegue ter alegria com pressa.”
Um legado que continua
Ao final da entrevista, William reafirmou que o livro é uma homenagem ao seu pai e à sua mãe, mas também um chamado à nova geração:
“Você não precisa ser filho de um mestre para levar o sistema adiante. Basta compreender. E ter coragem de viver com profundidade.”
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O Polo São Paulo de Kung Fu Ving Tsun (Wing Chun) está localizado na Avenida Nova Independência, 581, próximo à Avenida Luiz Carlos Berrini, no Brooklin. A escola está cercada por importantes bairros da cidade, como Brooklin Velho, Brooklin Novo, Santo Amaro, Alto da Boa Vista, Chácara Santo Antônio, Campo Belo, Morumbi, Panamby, Moema, Vila Olímpia, Itaim Bibi, Pinheiros, Jardins, Jardim Paulista e Vila Nova Conceição.
✍️ Texto baseado na entrevista conduzida por Márcia Miyamoto no Polo São Paulo de Kung Fu Ving Tsun, com participação especial de Alexandre Pereira, discípulo do Mestre Sênior Washington Fonseca.